A adolescência pode ser considerada uma etapa surpreendente e maravilhosa da vida. Contudo, há muitos adultos que insistem em chamá-la de “aborrescência”. Será? Não será mais bem que os “aborrescentes” são aqueles que desconhecem ou fazem desconsiderar as características normais dessa fase da vida? Eis o que diz Sampaio com respeito a esse assunto:
O próprio sentido do devir, da novidade, sempre se fez acompanhar de medo e de alguma resistência a esses movimentos de mudança. O mudar exige a capacidade de reelaborar sentimentos internos e reorganizar uma nova relação com os outros. É o desafio que a aventura da adolescência impõe ao adolescente e também às famílias! (Sampaio 1993)
Por isso, do ponto de vista humanizador, é preciso defender o começo de um despertar para um mundo novo, onde é possível ser ator/atriz principal da própria vida e, consequentemente, adquirir a capacidade de poder mudar a história.
Na adolescência, a coexistência de dois sentimentos que se defrontam, gera certa inquietação nos adolescentes: autonomia/dependência, crescer/regredir...
Também nessa fase ocorrem pelo menos três fenômenos importantes do desenvolvimento humano: do ponto de vista biológico, a puberdade, com o amadurecimento sexual e da capacidade reprodutora; do ponto de vista social, a passagem da infância para a vida adulta, com a aquisição de papéis adultos e também a conquista da autonomia em relação aos pais; e, do ponto de vista psicológico, a estruturação de uma identidade definitiva para a subjetividade, onde é possível definir o seu projeto de vida.
Adolescer, crescer, implica em autonomia e também em novas responsabilidades, que antes não eram vivenciadas pela criança. E, se existe algo que deixa os adolescentes indignados é justamente a negação dos pais quanto ao crescimento de seus filhos. Muitas vezes, os filhos estão na adolescência e continuam sendo tratados como crianças. Aí está uma prova da não aceitação da aquisição de mais autonomia do adolescente.
O relato de um adolescente de 16 anos, a seguir, expressa essa realidade sentida por outros adolescentes:
Às vezes penso que ser adolescente é uma das coisas mais difíceis do mundo, pois a gente tem que provar que existe, que tem pensamento, que tem sonho e que é capaz de realizá-los. E quando vacila, comete um erro, caem em cima da gente com tudo. Adulto que é que adulto erra porque é humano, mas adolescente não é humano. Adolescente erra porque é aborrescente...
Adolescente de 16 anos.
As diversas experiências da criança (escola, amizades, grupos esportivos, religiosos etc.) e o seu amadurecimento vão gradativamente ampliando o horizonte de suas relações que, em articulação com as práticas de criação familiares, irão configurar as condições em que vivenciará o processo central da adolescência: emancipação em relação à família, construção de autonomia pessoal, interiorização das pautas culturais e de valores, que tendem a ser conservados ao longo da vida (Fierro, 1995, p. 299).
Neste momento, ganham importância os amigos, a "turma", instância de identificação, troca, novas alternativas e aceitação sem reservas. Importante apontar que as relações conflituosas que por vezes se estabelecem na família envolvem adolescentes e pais. Estes últimos, também experimentam situações que podem dificultar a compreensão do que se passa com o adolescente. Entram em cena tanto as repercussões da própria adolescência dos pais, quanto os que vivem no momento atual, com a proximidade da meia-idade e consequentes reflexões acerca dos sonhos realizados ou frustrados.
Mas, esta fase não é feita só de perdas e de conflitos. Muito pelo contrário. Alegria, disposição, vontade de mudar o mundo... Nunca uma pessoa terá tanta energia para criar, se divertir e questionar o mundo quanto na adolescência. Um novo mundo se abre e inúmeras possibilidades se abrem à sua frente!
Laugrinei Pereira B. da Anunciação
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Referências:
Referências:
FIERRO, Alfredo. Relações sociais na adolescência. In: COLL, César; PALÁCIOS, Jesús; MARCHESI, Álvaro (orgs.). Desenvolvimento psicológico e educação: Psicologia evolutiva. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. v.1. p. 299-305.
SAMPAIO, Daniel. Vozes e Ruídos. Lisboa: Editorial Caminho, 1993.
Bom dia !
ResponderExcluirMuito bom o texto sobre a adolescência. Tenho falado em minhas palestras para pais e adultos em geral, mais ou menos isso que foi escrito no início do texto, sobre a questão de chamar os adolescentes de "aborrecentes". Jogo a bola para eles, os adultos, que de fato muitas vezes são piores que os adolescentes, birrentos, ranzinzas, caras amuadas, fechadas por qualquer coisa que aconteça. O adolescente perdoa com facilidade, esquece, apaga, passa uma borracha e pronto. O adulto diz que perdoa mas guarda mágoas; mesmo reclamando o adolescente diz não, mas depois se arrepende a faz o que foi pedido, o adulto tem mais malandragem, diz que sim, mas depois acaba não fazendo o prometido... e assim vai. Então, o que acontece com o adulto que um dia foi adolescente? Será que existe um mecanismo que faz a gente esquecer da nossas adolescencia, das nossas crises, das nossas rebeldias quando estávamos nessa fase?
Por isso concordo com o texto. Precisamos colaborar com os adolescentes para que ele cresça saudável, em sabedoria, graça, saúde, diante de Deus e dos homens.
Ir. João Batista Pereira